Li o livro “O Código da Vida”, do advogado Saulo Ramos. Se alguém tivesse escrito alguma crítica isenta do livro, e eu a tivesse lido, com certeza não teria me dado ao trabalho de ler essa obra.
Um verdadeiro desfile de vaidades. O autor escreveu um livro apenas para tecer loas a si mesmo. Narrando aquilo que considera importante na sua vida, ele não vê um defeito sequer em si próprio ou no que fez. Em compensação, não teve o menor pudor em apontar defeitos até em sócios do seu escritório, o que, sem dúvida, deve ter causado um enorme constrangimento. Como falar do patrocínio infiel (advogado que defende duas partes contrárias) de José Frederico Marques. Ou que redigiu a sentença para um juiz. E o pior de tudo foi ter dito que conseguiu um habeas corpus para um cliente porque ligou para a casa do ministro presidente do STF. Pergunto: qual a mensagem que passa o autor? Pra mim, é a de que sua advocacia foi erguida com base no tráfico de influência, no más…Eu fiquei escandalizado com a forma tranquila que o autor conta essas coisas, como se fossem mérito seu, não importando a situação constrangedora que aqueles que lhe prestaram um favor e que agora se vêem expostos. Uma vergonha.
Além disso, o autor se considera meio gênio – seja na poesia, seja no direito, e, no nosso meio, venhamos e convenhamos, não se trata de nome conhecido como jurista, mas apenas como advogado caro.
Escandalizou-me ainda o fato de ter dito que indicou alguém como ministro do STF, esse ministro votou contra seu amigo (Sarney), ele o chama de “Juiz de Merda”, o tal ministro visita-lhe quando hospitalizado, ele disse que pensou em nem citar o caso de ter xingado o ministro por causa desse gesto, mas não o fez porque, palavras suas, odeia mentir. Como se isso fosse mentir…
Enfim, um livro reacionário, destinado a criticar sem qualquer embasamento os seus opositores (Lula, FHC, Bernardo Cabral, Celso de Melo, etc.), e a cumprir um propósito narcisista do autor. Coisas como o vinho caro que bebeu ou sobre seu livro de poesias (do qual ninguém nunca ouviu falar) que foi lançado no salão do livro em Paris.
Enfim, caso não tenha lido, não perca o seu tempo. Melhor assistir o “Ricos e Famosos”. Pelo menos não se tem a decepção de ler algo com a idéia que seria uma obra sobre uma vida dedicada à advocacia. Foi uma obra dedicada a si próprio, a uma auto-glorificação boba, pueril.
07/11/2008 em 17:19
“com certeza não teria me dado ao trabalho de ler essa obra” – Pelo visto, obra, aí, no sentido denotativo e conotativo, não? 🙂
07/11/2008 em 17:23
hahaah ah, vc… sempre foi boa em português… 😀
12/11/2008 em 21:07
O que mais me chama atenção, entre outras coisas, claro, é o seu comentário no último parágrafo: “o propósito narcisista do autor”. É justamente o que eu pensava enquanto lia, no avião de SSA para SP, o “livro” DOUTOR MACHADO: O DIREITO NA VIDA E NA OBRA DE MACHADO DE ASSIS. O livro é, sem dúvida, da piores publicações sobre Machado e, creio sem medo de errar, que, ao fim e ao cabo, serve apenas para os propósitos narcísicos dos autores, os “dôtores” Miguel Matos e Cássio Schubsky.
Sem entrar no “mérito”, ou melhor da falta de quaisquer méritos teóricos, críticos e historiográficos, Francis, você não tem noção da “ruindade” do arrazoado dos nossos advogados. A melhor, quero dizer: a pior, parte fica por conta dos apelidos os quais eles criaram para se referir a Machado de Assis: dos quais Xaxá é o mais brilhante!
O curioso é que os caras desperdiçaram um bom mote para uma pesquisa séria. Porque há em todos os romances de Machado referências jurídicas e sempre há personagens bacharéis em Direito. Até o Bentinho era um deles. Mas, quando eu penso em advogados deste tipo, como os tais Miguel e Cássio, lembro-me do Brás Cubas, mais precisamente no Capítulo XX, “Bacharelo-me”. “(…) era um acadêmico estroina, superficial, tumultuário e petulante, dado às aventuras, fazendo romantismo prático e liberalismo teórico, vivendo na pura fé dos olhos pretos e das constituições escriptas. No dia em que a Universidade me atestou, em pergaminho, uma ciência que eu estava longe de trazer arraigada no cérebro, confesso que me achei de algum modo logrado, ainda que orgulhoso”.
O livro é mesmo um (ma)logro. Cumprei-o num ímpeto ainda no Aeroporto Dois de Julho, sofri as penas de um ato rápido, não pensado.
13/11/2008 em 13:48
Elton, seu comentário me fez lembrar de outros casos de propaganda enganosa. Veja que o livro de Saulo Ramos, em sua capa, dá a entender que se trata quase que de uma obra de ficção, sem sequer fazer referência à natureza autobiográfica da obra.
Mas outro caso que me vem à mente é o livro “Memória das Trevas”, que promete ser uma “devassa” na vida de ACM. Pois bem: o título, bem como o mote do livro, é apenas usado para vendê-lo. O livro é, na verdade, uma lista de episódios da vida do autor que este considera ser do interesse do leitor, falhando miseravelmente em tal julgamento. Eu, por exemplo, não tenho menor interesse nas viagens que ele fez. Viajar por viajar, basta entrar em uma agência de turismo. Ora, bolas…