No passado, já escrevi aqui sobre a minha preocupação a respeito do uso exagerado da tecnologia, e o quanto isso pode ser prejudicial, ou, melhor dizendo, o quanto isso supostamente pode nos alienar em relação à vida “lá fora”.
Mas outra coisa tem me preocupado esses dias – e, ao que parece, não só a mim, como poderão facilmente perceber: o tal déficit de atenção.
Em primeiro lugar, algo me tranquilizou um pouco: conheço muita gente que suspeita ter transtorno de déficit de atenção, hiperatividade, etc. Eu mesmo já me perguntei se teria algo assim. Dia desses assistindo Ana Maria Braga (não ria, caro leitor – você ainda há de morar no exterior e devorar qualquer coisa que lhe dêem em sua língua natal – de Ana Maria Braga a “Ai se Eu te Pego”), vi uma reportagem interessante sobre a banalização do Transtorno do Déficit de Atenção. Afinal de contas, quem nunca esqueceu a chave de casa? Embora eu ainda acho que tenho alguma dificuldade em me concentrar em escutar algum monólogo superior a 10 minutos, de repente percebi que isso pode ser algo inerente à minha personalidade, uma idiossincrasia minha, e não um transtorno (algo muito chato quando se é advogado, por exemplo, e se tem que escutar um depoimento de alguém falando por horas…).
Mas, porém, contudo, todavia, se colocamos de lado a possibilidade de que todos temos o tal transtorno, percebi – com a ajuda dos artigos abaixo – que estamos vivenciando uma transformação no nosso modo de processar informação. E não sei se isso é bom ou ruim.
Quando concluí a faculdade, a internet ainda não era a ferramenta de estudo por excelência. Porém agora, ao voltar a estudar, percebi que, a não ser por dois livros didáticos do currículo (um deles em formato eletrônico), todo o meu material de estudo encontra-se online. Ou seja: estudo praticamente no computador. E é aí que mora o problema: parece que o uso sistemático de ferramentas de busca, hiperlinks, múltiplas janelas abertas, etc., não faz com que estudemos de forma reflexiva, mas utilitária.
Segundo um dos artigos, nós passamos nossos olhos por textos cada vez menores, porque dificilmente nos prendemos, na internet, a textos longos – há uma miríade de fontes a nos ensejar que consultemo-nas. Raramente voltamos ao lugar onde começamos a pesquisar. Veja: antes, nossa leitura era profunda – entrávamos em um estado de imersão no livro. Sem distrações, sem alternâncias.
Isso sem falar das outras atrações da internet: Facebook, Twitter, mensagens instantâneas, notícias atualizadas. Ou seja: estamos o tempo inteiro aptos a consumir informação. Um dos artigos fala, inclusive, no fato de que o Facebook se torna, cada vez mais, o espaço de interação por excelência: para se sentir integrado, precisamos conhecer cada nova piada ali postada, cada novo “trend”. Fora da vida online, nossas experiências de interação acabam reduzidas e, mesmo assim, orientadas ao que acontece online: os assuntos giram em torno do que é notícia nas redes sociais.
Se por um lado essas redes propiciam possibilidades de relacionamento inéditas – não é preciso esperar o Natal ou outra época propícia a reencontrar amigos e parentes para nos inteirarmos do que tem acontecido com eles – por outro, nossas experiências acabam orientadas para a profusão de informações a que somos submetidos quando ligamos nosso computador. Eu percebi, por exemplo, que para ler a Folha de São Paulo (online), o jornal da Noruega que leio (ou folheio) e o meu feed de RSS, bem como o feed do Facebook, pelo menos 3 horas diárias são necessárias. 2 horas, com algum esforço.
Ao lado disso, sempre customizei a interface do meu computador para que tivesse acesso a qualquer informação relevante. Uso o Growl, que avisa desde quando alguém se conecta ao Skype até qual o assunto do e-mail que acabei de receber. Cada novo evento tira o foco do meu trabalho, ainda que por um segundo. Claro, foi uma opção minha, e é claro que posso desligar essa função. Mas as distrações podem vir de todo o canto: desde o sms no celular à tentação de olhar o Facebook, o Twitter, o Foursquare….
E esse hábito de processamento contínuo de informação (ler o que interessa, descartar o resto), faz, ainda de acordo com os artigos que li, com que tenhamos maior dificuldade de atingir aquele mencionado estado de reflexão que costumávamos ter quando de uma leitura metódica.
O assunto tem me preocupado. Percebi que poderia ter rendido muito mais no meu estudo no semestre passado. Percebi que, antigamente, as pessoas liam muito mais para se preparar para as provas. Porém, o Google nos torna um pouco mais estúpidos, já que o importante não é mais aprender, mas sim saber onde está a informação.
Até o iPad agora tem notificações. Acho que vou desligá-las. Tenho tentado ler no Kindle, e tem sido fantástico, porque, após algum esforço de concentração, percebo o quão tranquilizante é poder me deter em uma coisa, sem o stress mental advindo da experiência de buscar algo na internet e, de repente, me ver pesquisando 10 coisas diferentes que não guardam nenhuma relação entre si (nem muito menos com o que me propus a pesquisar).
Não sei se estamos entrando em uma nova era onde teremos que mudar a forma com que lidamos com o conhecimento. Também não sei se estamos ficando mais passivos em relação à informação. Se por um lado a vida moderna parece nos cobrar uma certa atualização frequente no que se refere ao quanto nos informamos, por outro lado me parece claro que isso acaba roubando de nós tempo em que poderíamos estar, de fato, vivendo.
Artigos mencionados:
08/01/2012 em 12:38
É verdade; estou vivenciando isto. Ontem recebi uma lista com 16 títulos cuja leitura é indispensável para o doutorado, todos digitalizados, e estava tentando criar uma estratégia de como me dedicar a esta leitura sem ter que imprimir tudo, e ao mesmo tempo, me “livrar” das interferências digitais.