Tá, eu confesso: sempre tive certa adoração por Portugal. Sempre gostei daquele jeito de falar, às vezes ininteligível. Sempre me interessei por coisas portuguesas, seja ao ter perguntado, aos 11 anos, na aula de história, “tá, mas e os portugueses, esses vieram de onde?”, seja quando arrepiei-me ao ouvir Grandola Vila Morena pela primeira vez (e tê-la cantado junto a outros tugas em uma mesa de ano-novo em Monção).
Sempre tive interesse pelas coisas correlatas do meu mundo em outros países – seja da profissão, seja de outras coisas com as quais lido. E com Portugal a curiosidade é ainda maior: como será uma missa ou um culto em Portugal? Como será uma reunião maçônica? E, mais importante: como será o exercício das funções do advogado? Terão eles assistência judiciária gratuita? Lidam com oficiais de justiça? Brigam ou representam contra juízes?
Enfim, tantas perguntas… E, pior de tudo: o idioma não ajuda. Por ser nação mais antiga, são bem mais complexos. Lá não existe só o advogado: há o solicitador. E o que um advogado faz que um solicitador não faz? Não sei… Busco a Lei própria que define os atos (actos) dos advogados e solicitadores. E a tal lei diz o seguinte:
“Art. 1º, 5 – “Sem prejuízo do disposto nas leis de processo, são actos próprios dos advogados e dos solicitadores:”
Ou seja, não diz a lei quais são os atos próprios de cada profissão, per si, mas as comuns às duas. No Estatuto da Advocacia deles o assunto não se resolve, quer dizer, disciplina as prerrogativas da profissão, mas sem diferenciá-la dos solicitadores. No frigir dos ovos, parecem que podem fazer a mesma coisa. Agora a lei dos atos próprios chega a conter uma daquelas pérolas de sabedoria que pensei só nossas normas tinham: o óbvio:
“2 – O título profissional de solicitador está exclusivamente reservado a quem, nos termos do respectivo estatuto, reúne as condições necessárias para o adquirir. ” – ou seja: é solicitador quem tiver o que lei entender necessário pra ser solicitador. 😀
Agora fantástico mesmo foi descobrir as expressões que eles têm. Vejamos um único parágrafo:
“O processamento das contra-ordenações e a aplicação das coimas referidas no artigo anterior compete ao Instituto do Consumidor, mediante denúncia fundamentada do Conselho Distrital da Ordem dos Advogados ou do Conselho Regional da Câmara dos Solicitadores territorialmente competentes. ”
Alguém entendeu alguma coisa?
Pelo que entendi, processamento significa o processo administrativo, contra-ordenações deve ser algo como crime, contravenção ou infração. Coima, multa. Instituto do Consumidor? Er… será que falamos do que?
Enfim, há um mundo por descobrir do outro lado do Atlântico, riquíssimo, também na nossa profissão. É pena não lermos tanto os juristas de lá (talvez não consigamos entender, muito embora Canotilho seja popular nos cursos de pós-graduação por aqui). Há várias coisas curiosas: Eles também têm trajes profissionais obrigatórios, herança que temos, infelizmente, apesar de, por sermos tropicais, deveríamos ser mais flexíveis. Eu tentei: no primeiro ano da profissão, fui a uma audiência de jeans e camiseta. Não me deixaram entrar, e hoje a cidadã que me barrou, amiga minha, trabalha comigo na procuradoria e, na primeira semana de trabalho, me disse ela: “Você se lembra que te barrei?”. Disse eu: “lembro, filha da mãe…”… ehehhehe
Como se chamarão os despachos citatórios? E os atos ordinatórios? E os despachos saneadores? E os promotores do Ministério Público (que aqui são os acusadores e fiscais da lei)? Magistrados, que aqui são só juízes, lá são outros?
Só estudando uma futura pós-graduação em Coimbra – 500 depois, e ainda é chique fazê-lo… 😀
25/02/2009 em 22:05
🙂
Oh Francis, tens que vir para cá e em meia dúzia de meses percebes tudo!
26/02/2009 em 00:02
Só mesmo indo a dar uma vista de olhos ou uma espreitadela neste sítio…
27/02/2009 em 20:14
Leia Paula Costa e Silva, autora portuguesa de processo de primeira ordem. Vais gostar!