Nada lembra mais a Diatadura Militar do que as eleições. Aliás, acho que a forma de condução do processo eleitoral hoje é, talvez, sob alguns aspectos, mais ditatorial do que na época da Ditadura.
Primeiro, é esse clima de “Ordem”, de “segurança nacional”, como se estivéssemos em estado de sítio. Não pode isso, não pode aquilo. É a chance que os ditadorezinhos de plantão têm para colocar suas vocações autoritárias para fora. É policial que vê em camisa vermelha/verde/azul como se fosse conluio para propaganda fraudulenta. É Juiz Eleitoral visitando seções de votação como se fosse coronel.
Minha desilusão com a política é ainda maior quando o assunto é eleição. É quando as pessoas colocam as instituições de lado para defenderem o que acham. Reparem que, para as eleições, todos os princípios constitucionais são relativizados, sem lógica alguma, só para que algumas pessoas se sintam mandando e tenham a sensação de que as massas estão domesticadas. Mas eu chego lá.
Primeiro, continua a ridícula, anacrônica e demodê proibição da boca de urna. Tudo para preservar uma suposta “ordem”, típico da Ditadura, onde uma mosca voando era atentado à segurança nacional. Ganha uma quentina-de-mesário quem responder qual o sentido de proibir a propaganda eleitoral no dia da eleição. Antes, a proibição era para impedir que os partidos de esquerda, que tinham militância, pudessem angariar mais votos. Hoje, serve para que policiais e juízes mostrem quem manda. E, depois, os processos ficam lá, entupindo os armários da Justiça Eleitoral, incomodando serventuários, advogados, partidos, militantes e os mesmos juízes, já que tem muita coisa mais importante para ser julgada.
As constantes restrições à propaganda são outro retrocesso: a questão não é disciplinar as eleições, a questão é ter a sensação de controle. Não é por outra razão que um imbecil qualquer propõe uma lei para controlar publicidade eleitoral na internet, como se fosse possível submeter uma rede mundial às indiossincrasias tupiniquins. Ai o TSE (e depois o Congresso, a reboque), define até o que é outdoor e o que é placa, fazendo, a cada eleição, surgir as maluquices – placas móveis, carregadores de estandartes, bonés, enfim – sempre limitando a livre expressão e, ao mesmo tempo, permitindo subterfúgios patéticos que, possivelmente, só existem aqui mesmo.
Depois, a ridícula lei seca. Como se domingo deixasse de ser domingo. Como se tivéssemos que assistir a uma missa durante o dia todo, ou ficar em casa, apenas porque se trata de eleição. Na verdade, esse ano a lei seca não foi obrigatória em vários estados, mas aqui em Conquista os Juízes, provavelmente para evitar trabalho para eles mesmos, suspenderam a venda de bebida alcóolica. Claro, a desculpa vai ser, sempre ela, a “ordem”, que tem que ser mantida a todo o custo. A mesma “ordem” que tem que ser mantida prendendo um bocado de pobre coitado cujo crime é distribuir um santinho.
Enfim, o que deveria ser uma festa cívica se transforma em um flash de restrição ditatorial do comportamento do brasileiro. É uma emulação do comportamento típico das ditaduras: o controle completo das massas, para que sejam dóceis e domesticadas. Nem que seja por um só dia.
E aí convivemos com as idiotices todas, que violam a Constituição que, engraçado, é democrática: boca de urna, propaganda eleitoral irrestrita (tudo violando a liberdade de expressão, que é princípio constitucional), boca de urna e ficha limpa (que violam o princípio da presunção de inocência), horário eleitoral gratuito (que confunde venda de coca-cola com difusão de propostas), etc.
Enfim, o que outros países comemoram como festa cívica (ou, na verdade, apenas como uma forma apática de cumprir uma obrigação imposta pelo Estado), aqui nos serve apenas para nos lembrar que não é seguro segurar um santinho, não é permitido usar uma camisa com o nome do candidato preferido, não pode beber uma cerveja mesmo com um calor de 35 graus. Enfim, não pode.
É o País onde a bandeira nacional não pode ser vestida. É o país onde a justiça não consegue julgar criminosos, mas empilha processos por boca de urna.
Tudo no Brasil é isso – blábláblá, e pouco desejo de ver as coisas como são.