A Ministra Eliana Calmon, magistrada com altos serviços prestados, disse em uma entrevista o que juízes não gostam de ouvir. Juízes, via de regra, não costumam gostar de receber críticas, pelo menos não as coletivas. Sentem-se pessoalmente atacados, como se as instituições não devessem ser criticadas. Eu nunca me senti pessoalmente (pelo menos nem sempre) atingido quando a minha categoria – a de advogados – recebe ferozes observações da sociedade. Críticas gerais sempre serão injustas quando consideradas individualmente, isso é óbvio, e só alguém desprovido de razoável bom senso poderá admitir que uma crítica a uma determinada categoria significará demérito para cada integrante dessa categoria.
Pois bem: o que irrita, no caso da Ministra Eliana Calmon, é que ela não disse nem mais nem menos do que todo mundo sabe, o que todo mundo vê acontecer, mas que, por força de uma suposta canonização do Poder Judiciário, ninguém se atreve a dizer. Por algum acaso, pergunte-se a qualquer promotor ou advogado, ou mesmo a alguns juízes, se não faz sentido a frase “É preciso acabar com essa doença que é a ‘juizite'”, proferida pela Dra. Eliana Calmon. Ou, quando ela diz “Hoje é a política que define o preenchimento de vagas nos tribunais superiores, por exemplo.”, não está a dizer algo que todos nós suspeitamos?
Parece que debater o judiciário, no Brasil, citando-se as práticas nefastas, é pecado mortal. Se a Ministra tem a coragem de dizer o que viu, ao invés de constranger seus pares, longe disso, viram uma nota pública ser assinada pela maioria dos outros ministros. Isso é uma vergonha. É sinal de que o Poder Judiciário agiganta-se, no pior sentido da palavra. Se já não bastasse o apetite legiferante que assola o PJ nos dias de hoje, é ainda mais assustador ver que esse Poder não parece disposto a se questionar, a admitir as suas falhas, a questionar suas condutas reiteradas, a de não exigir para si o mesmo padrão de moralidade, eficiência e ética que costumam cobrar dos outros poderes em seus pronunciamentos e decisões.
Ou o Poder Judiciário para de usar de argumento de autoridade e começa a aceitar o transparente debate e críticas da sociedade, dando o exemplo necessário que deve partir principalmente de quem dá a palavra final, ou estaremos diantes de uma ditadura judicial incompatível com o Estado Democrático de Direito. Uma ditadura onde a hipocrisia de se criticar uma Ministra que disse o que todo mundo sabe passa a ser forma de intimidação a quem pretende ser transparente ou mostrar sua opinião.
Talvez eu não teria escrito isso se os senhores ministros se limitassem a dizer que não concordavam, ou que era uma visão pessoal da ministra. Mas não, vieram com o discurso cínico de que as afirmações foram levianas porque não destinadas a alguém individual… Isso é tão cínico e covarde, e mostra que pretendem usar da força e da intimação para coibir a crítica institucional. É uma vergonha, mesmo.