O oficial é ser ignorante

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Influenciado por um amigo mais sensato e menos colérico, resolvi não me envolver mais em discussões políticas no Facebook – pelo menos não em português, já que o mar não está pra peixe e os nervos ainda estão inquietos. Não tenho um pingo de vontade de passar na cara de ninguém o quão estúpida foi a decisão de votar em um ignorante obscurantista pra presidente da república, porque nunca foi segredo pra ninguém que esse governo, ainda que desse certo, estaria dando errado. Poucos se deram a uma análise fria de que eleição não é escolher a quem se gosta, mas sim o menos pior. 

Eu vou em breve adquirir uma outra nacionalidade. Às vezes penso em renunciar à nacionalidade brasileira, não porque eu seja um boçal que deixei meu gosto geralmente brega me contaminar a tal modo que me teria levado a praticar a maior das breguices, a saber, cuspir na própria origem. Afinal de contas, não existe uma diferença entre mim, o brasileiro, e o Brasil, país. Somos um só. Mas chega um certo ponto em que a gente se permite uma certa vergonha na cara. E essa vergonha na cara é que me faz não querer ser mais condescendente com a ignorância.

Sempre acusaram Lula de fazer apologia à falta de educação (formal). Eu nunca enxerguei isso nele, mas vá lá. Mas o que dizer de tanta gente com curso universitário desdenhar da formação acadêmica e substituí-la pela convicção formada no próprio fígado? Que desprezo é esse pela única forma – ainda que imperfeita – de atestar conhecimento? 

Um exemplo, claro, é o Olavo de Carvalho – auto proclamado filósofo que se credencia a ensinar filosofia e que um monte de gente que passou pela academia aceita numa boa. Como alguém que passou pela universidade, onde o saber é provado pelo fogo, pelo debate, pela contradição, pode aceitar um oráculo? Como podem enxergar a academia como um antro de marxistas, quando o que me lembro da faculdade é justamente a pluralidade de idéias, onde existiam os positivistas, os garantistas, os do “direito achado na rua”, e por aí vai? Como alguém formado em Direito – e aqui menciono o direito apenas por ser a área da academia que conheço mais – pode confiar mais no próprio fígado e senso pessoal de justiça, quando todo o propósito da formação jurídica é a de que o direito substitui a barbárie e o senso comum? 

Como gente que viaja para países civilizados que garantem a diversidade, o respeito comum e o debate honesto podem voltar pra casa e eleger a truculência? Como se pode achar que o Brasil é tão especial que se pode dar ao luxo de querer chegar ao primeiro mundo com valores de quinto? Ou alguém já viu algum país desenvolvido se eleger com uma plataforma tão retrógrada? Vejamos: quase todo país civilizado libera o aborto, combate fortemente o racismo, o politicamente correto é norma de conduta em sociedade e minorias são respeitadas. Que arrogância é essa de achar que o país pode ir pra frente indo ao contrário disso tudo? Que quando se quer civilidade é apenas praticar mimimi?

Quando foi que as pessoas se deixaram cegar pelo próprio fígado e fazer comparações sem base concreta? Eu cito um exemplo: como alguém pode ter assistido a Dilma fazer sua própria defesa por horas no senado e ainda achar que ela é uma sem-noção apenas por causa de comentários informais como aquele da mandioca, e assim achar que esse senhor que os lidera seria mais articulado? Como achar que Lula foi o maior corrupto que existiu quando toda acusação que pesa contra ele seria uma reforma de um apartamento que ele não comprou e de um sítio que não é seu, quando só o filho do atual presidente ganhou milhões em poucos anos em atividade suspeita? Como gente que foi a faculdade se permite raciocínios tão básicos e sem sequer alguma crítica? Veja, eu não estou discutindo a possibilidade de Lula ser corrupto – acho até que aceitou sim vantagem indevida. Mas se uma história suspeita admite uma versão plausível, não passa, pra mim, de história suspeita, ao menos no que se refere a um processo judicial. Cada um que tenha sua convicção, mas direito não é feito de convicção pessoal.

Eu estou gastando essas linhas com essas mini diatribes por uma razão simples, como que fazendo rodeios: como gente que foi a uma universidade não consegue entender que um jovem morto asfixiado durante 4 minutos de tortura por um segurança é apenas o resultado desse mantra brasileiro de que “bandido bom é bandido morto”? 

Quando você diz que quando se defendem os direitos humanos não se está a pensar nas vítimas, como você então explica isso? 

Não, se o Brasil é isso, não sei se quero continuar a ser brasileiro. 

Autor: francis

the guy who writes here... :D

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