Sei que um relato pessoal não explica algo tão complexo quanto as relações internacionais de dois países tão próximos quanto são Espanha e Brasil. Mas, se não explica, pode muito bem ilustrar…
Eu já entrei na Europa por aeroportos portugueses, alemães, suíços, suecos, belgas e noruegueses.
NUNCA me pediram nada além do passaporte e passagem aérea. Algumas (poucas) vezes, me perguntaram a razão da viagem, quantos dias iria permanecer, etc. Uma vez, houve uma certa rudeza na saída da Suíça, mas nada que mereça menção.
Em Portugal, país que recebeu milhares de brasileiros, sempre fui especialmente bem tratado – ou com bom humor, ou com educação. E, diga-se: já entrei em Portugal sem um centavo no bolso (apenas com um cartão de saque do meu banco). E isso em épocas que o Brasil não era queridinho mundo afora. Sei que possivelmente outros tiveram experiências diferentes, mas não posso deixar de registrar que, apesar de ser um país pequeno, Portugal, ao que me parece, nunca deixou de cumprir, com certa resignação, com o papel de pai que tem certas responsabilidades com o filho rebelde e peralta. Claro, nunca vivi em Portugal, desconheço a situação dos imigrantes brasileiros por lá. Mas, no que diz respeito a aeroportos e pessoal de alfândega, sempre fui tratado com respeito.
Infelizmente, não posso dizer o mesmo da Espanha. Em Barajas, em uma área de trânsito que mal tem um restaurante, o sujeito passa fome, a não ser que se entupa de torrões de Alicante vendidos no duty-free. Lembro-me que, apesar do atraso do vôo para o meu destino final, sequer me deixaram sair da área de trânsito, mesmo dizendo que, ora pois, ficar 10 horas em uma área de trânsito sem comer não é agradável. A brutalidade com que me negaram uma mera saída nunca me foi esquecida (assim como também nunca me esqueci da amabilidade de um agente do aeroporto que intercedeu para que me liberassem para poder comer).
Isso talvez seja um retrato do tratamento de brasileiros na Espanha. Mas a questão é mais grave.
Primeiro, eu não espero que deixem entrar brasileiros que não comprovem condições de permanecer no país. Isso é indiscutível. O que é ruim é que os critérios não são claros e, ainda pior, que o tratamento dado ao turista frequentemente é humilhante. Ao que eu saiba, o Brasil, ao adotar a reciprocidade, pelo menos o faz de forma adequada, conforme o depoimento dessa turista espanhola aqui.
Segundo, que a justificativa do Sr. Embaixador da Espanha, a de que cumpre exigências do Espaço Shengen, não engana ninguém. Países com problemas maiores de imigração não costumam impor tanta deportação e tantas condições de maus-tratos aos turistas brasileiros. Como exemplo, volto a citar o querido Portugal, mas poderia citar a Suíça ou mesmo a Noruega, países onde em algumas cidades os imigrantes chegam a formar 25% da população.
E não venham dizer que a medida veio porque agora estamos recebendo mais trabalhadores europeus – o Brasil costuma adotar a reciprocidade já há tempos, e já o fez com parceiros econômicos de poderio bem maior, como com cidadãos americanos que foram desrespeitosos com as autoridades brasileiras.
Acho que os povos precisam exigir dos seus governos, sem embargo das justas limitações à imigração ilegal, decência no trato com os estrangeiros. “They are us“, já disse Pete Hamill. Na hora em que o Brasil começar a ser arrogante ou prepotente – o que me orgulho de dizer que não foi até agora – serei o primeiro a me revoltar. Mas amor próprio só faz bem a um país.
Sobre o assunto, excelente artigo de Elio Gaspari pode ser lido nesse link.